"Todos os dias você tem que moldar e se modificar"
Bruna Luana de Souza Cruz, discente do último período do curso de Zootecnia foi a
entrevistada do mês e nos conta suas experiências. Seu primeiro estágio voltado para a área
da piscicultura foi em 2018 e este durou dois anos e meio na Empresa Aquacentro Instrutória e Assistência Técnica, empresa voltada a prestar assistência técnica e consultoria para piscicultores e também teve uma parceria com um produtor, trabalhando direto com ele. A empresa acompanhava cerca de 47 produtores da área da piscicultura por meio de assistência técnica de forma terceirizada pelo SENAR e também de forma particular. Por dia, visitava em torno de duas fazendas que geralmente ficavam localizadas em Jataí e nas cidades vizinhas, e em suas tarefas, acompanhava o manejo da fazenda que envolve o controle de qualidade da água, a forma de alimentação que o cliente oferecia aos animais, biometria, onde se entrava no tanque para classificar o tamanho dos animais, controle sanitário, análise de doenças e parasitas, e havia também a despesca, o povoamento e a transferência de animais. Parte das responsabilidades da Bruna também se tratavam de controle financeiro e administrativo, com levantamento da piscicultura, inventário, cálculo de custos e gastos e índices econômicos e isso, inclusive, foi tema do TCC (trabalho de conclusão de curso) defendido por ela, onde foi apresentada uma análise econômica da produção do híbrido Jundiara (Leiarius marmoratus x Pseudoplastystoma reticulatum) em diferentes cenários de produção.
Em seu relato sobre como encontrou a oportunidade de estágio, Bruna contou que conhecia Cristielle Souto – proprietária da empresa Aquacentro – na época doutoranda na Universidade Federal de Jataí, e que sabia que as vezes alguns alunos a acompanhavam e então a pediu para que pudesse acompanha-la também, “porque eu tinha na minha cabeça que um zootecnista tem que ter o conhecimento de tudo, não o domínio, mas tem que ter ciência de como são as áreas de produção, porque ao sair para o mercado nós não estamos prontos para essa realidade, que é ter a visão do produtor. Essa realidade eu não tive só com a prática do trabalho, com a assistência técnica, eu tive essa experiência quando virei a produtora dos peixes, quando peguei uma parceria, então eu produzia os peixes, dava assistência técnica, então pude conciliar como é você estar na pele de ambas as partes”.
Perguntada sobre sua relação com chefes e clientes e sobre suas maiores dificuldades, Bruna aponta que nunca teve problema com “patrão”, mas relata sobre o problema que teve com um funcionário enquanto assumia uma fazenda para reorganiza-la. Durante sua parceria com um produtor, Bruna precisou morar alguns meses na fazenda e um dos funcionários do local não se comprometia a fazer nada, o que dificultava o trabalho. “Para muitos, a piscicultura ainda é vista como uma brincadeira, não é o fator chave, não é a produção principal da fazenda, as pessoas ainda pensam muito que é só jogar o peixe em um buraco e ele vai crescer, não vai precisar dar ração, não precisa fazer nada”.
Bruna fez seu estágio final no Projeto Tambacu, onde começou em setembro e terminou em
dezembro de 2020 e lá podia observar a qualidade da água e a parte nutricional. Quando o
estágio aconteceu, estava na época da piracema – momento de reprodução dos peixes – e
pôde acompanhar a reprodução de varias espécies, diferenciando cada uma, aprendendo
detalhes importantes. “Trabalhar lá pareceu a parte chave porque eu já trabalhava com a
parte administrativa que é recria e engorda e ali eu pude ver a parte da cria, então você tem
uma visão geral do pequeno produtor e do grande produtor porque você vê desde onde o
peixe sai até chegar na mesa do consumidor, parece que completou meu conhecimento na
área da piscicultura”.
Como seu estágio final perdurou sobre a época de pandemia, foi-lhe perguntado sobre como este momento afetou a oportunidade e Bruna explica que: “de forma indireta afetou no início, porque a mídia criou um pânico muito grande, então algumas pessoas realmente não souberam lidar de primeira instância com tudo o que estava acontecendo, então no começo muita coisa freou, muita coisa parou. No entanto, a nossa área de produção que é animais, eles não podem ficar sem comer e não podem parar de produzir, de crescer, não podem parar de dar leite de uma hora para outra nem parar de dar carne, uma planta não vai parar de fazer fotossíntese, então o agro não tem a capacidade de estagnar como qualquer outra empresa ou qualquer outro nicho de mercado, por mais que no começo algumas pessoas tenham ficado receosas, as assistências começaram ser de forma eletrônica, virtual, não tem como parar, então por mais que comece se tomar novas precauções ou novas medidas para atender seu cliente, indo mais preparado, maior higienização, não tem como parar de trabalhar e de produzir, a natureza não para, a natureza é constante, ela tem essa maravilha, essa constância. Então no começo realmente foi difícil, mas depois as pessoas viram que não tinha como parar, voltou com toda força”. Seu relato ainda nos revela que um dos maiores problemas no ano de 2020 foi o clima que influencia o crescimento e produção de peixes. “No Projeto Tambacu, a chuva é grande influência no período de reprodução dos peixes por causa da matéria orgânica em suspensão, pela temperatura dos dias, o tempo de duração dos dias, aspectos que influenciam na produtividade. Então o que realmente afetou nesse ano não foi nem a pandemia, foi o clima”. E se por um lado, a produção de peixe teve que diminuir pois os comércios estavam fechados, por outro lado “vimos pessoas esgotadas, cansadas de ficarem trancadas dentro de casa e começarem a sair para retiros, fazendas, sair para pescar, então na parte de alevinos teve uma queda porque as pessoas não queriam produzir mas também teve um aumento de venda para o outro nicho – o de pescaria, isca viva”, o que mostra que a produção de peixes não parou, apenas se expressou mais em um nicho do que em outro.
Sua dica para os estudantes da Zootecnia é: “eu digo para os alunos da Zootecnia, dou o meu exemplo. Eu entrei na Universidade com uma mente um pouco fechada porque a nossa visão de mundo ainda é pequena. Ao ingressar no curso eu entrei com o objetivo de ser geneticista, eu queria mexer com melhoramento genético e foquei no meu objetivo por um certo tempo que era mexer com gado, e de acordo com a vivência e a maturidade que você vai conquistando você vai entendendo que o mundo é grande demais para viver preso só na sua zona de conforto, então correr atrás de toda oportunidade que bater na sua porta ou ate mesmo de oportunidades que não estão batendo na sua porta é a melhor coisa que uma pessoa pode fazer. Ela abre a visão de mundo dela, ela tem mais domínio, mais segurança e sai mais preparada. Eu digo que um bom aluno não é aquele que vai formar em cinco anos, um bom aluno de uma universidade e um futuro bom profissional não é o mais inteligente mas é aquele que entendeu a essência do curso dele, é aquele que não só se preocupou com mérito e nota e sim em como o mundo o veria e, como ele sairia preparado para o mundo depois de cinco anos de faculdade. Então não adianta só você sentar e escutar uma verdade que não é empírica porque nós estudamos muita coisa que as vezes não é aplicado, então você ter humildade, cabeça no lugar e você entender que o mundo não é uma receita de bolo certinha, não tem um manual, porque cada lugar que você for vai ser diferente, que você está mexendo com pessoas e com animais, que todos os dias você tem que se moldar e se modificar, que você precisa dar razão a outras pessoas e que sempre tem várias formas de fazer a mesma coisa, cinco mais quatro são nove, sete mais dois são nove também então não tem uma única forma para obter o resultado. Ficar em uma zona de conforto e buscar só um objetivo com a cabeça fechada você não sairia completo para o mundo. Tentar conhecer um pouco de tudo e trabalhar, se doar inteiramente para a faculdade, seja em uma atividade que você não ganha ponto, horas, esteja porque você quer buscar conhecimento e crescimento, pois são as únicas coisas que você leva da faculdade”.
Comentarios